A hora passava lenta e calmamente, não tinha interesse nenhum em se apressar. Sentada ali naquele café olhando ao seu redor, todos com suas respectivas familias exaltando uma felicidade que só se vê em datas comemorativas ou em raras situações (já que na maioria das vezes as familias vivem em pé-de-guerra), sentiu falta de algo que houvera perdido há uns tempos atras. Ajeitou-se confortavelmente no sofázinho, degustou sem muito interesse o chocolate quente e continuou a observar os sorrisos, as risadas, faces, bocas, olhos era isso que costumava fazer: Observar. Pediu um pedaço de torta ao garçom, que lhe serviu com toda cordialidade merecida e continuou ali. O relógio era vagaroso, seu tic-tac parecia enferrujado e já não batia como quando era novo. Outro gole de chocolate e entra um casal aos risos, apaixonados. Apaixonados. Ela passa observá-los, ele era alto, moreno, olhos claros, cabelos lisos, um bom porte físico. Ela, a moça, mediana, morena também, cabelos ondulados, olhos escuros porem expressivos, delicada mas com jeito de ser forte, mais que ele até. Sentam-se, riem, conversam, beijam-se, adoram um ao outro, fascinavam-se. Num dado momento ele tira uma caixinha do bolso e mostra à ela. Pronto, preparem os sinos da igreja o vestido, o fraque, as daminhas e o pagem. Avisem as familias, correria com os convites, todos precisam saber da união destes dois jovens. E o padre? Vamos atras do padre e de uma igrejinha, daquelas pequeninas bem singelas! Tudo pronto, a marcha nupcial começa, a noiva entra com o seu vestido branco, o noivo a espera como sempre a esperou, feliz por está finalmente casando com a mulher da sua vida. O padre abençoa as alianças, pede aos noivos que se aproximem do altar: "Aceito" ela diz, "aceito" ele quase grita.
Ela continua a observar o jovem casal e a moça ainda não havia dado uma resposta. A hora passava muito mais rápido mas o tempo parecia congelado naquela cena, a moça pega a delicada caixinha e a devolve. Sim, devolve a caixinha. Ele vê o seu mundo desmoronando, ela não sabe que palavras usar para se desculpar, vê o seu amado sem a mesma alegria juvenil que sempre adorara, sente-se o pior dos humanos. Ele não consegue dizer uma palavra sequer, acabou, tudo acabou. A discussão começa. "Mas porque?" ele tentava entender o que não tinha explicação, ela dava desculpas sem pé-nem-cabeça "Acho que ainda está muito cedo, não sei... Não estou preparada". Ele tenta, em vão, convencê-la "Planejamos isso juntos! Você queria tanto quanto eu, cobrava-me uma prova de amor, dizia que queria passar sua vida ao meu lado e agora que sei que você é tudo o que sempre quis, você me deixa sem mais nem menos". Ela lacrimejava, ameaçava chorar mas seus olhos não a obedeciam, continuava firme "Eu te amo, mais do que qualquer coisa nessa vida mas ainda é cedo demais". Ele já estava morto, pelo menos era assim que se sentia, sem vida, sem cor não havia mais nada o que fazer ali., iria embora, provavelmente para fora da vida dela. Ela o viu saindo cabisbaixo, com os olhos vermelhos e com a caixinha na mão, levou as mão ao rosto e desandou a chorar. Levantou-se impulsivamente, e aparentemente arrependida, e foi em direção a ele mas o tempo havia passado, o relógio vagaroso voltou a funcionar como quando era novo, seu tic-tac era mais forte do que nunca. A hora do "aceito" havia passado, foi embora e agora o relógio corria com o tempo não dando tempo necessário para que as cosias fossem concertadas. Havia chegado a hora da decisão, e quem sabe qual seria a decisão certa? A juventude as vezes prega peças no próprio coração, cegando-o. A moça enxugou as lágrimas, passou um lápis preto nos olhos e saiu. Ainda tinha muitos anos para viver e o tempo estava passando mais rápido desde que entrara naquele café, o tempo agora corria.
Ela, continuava ali sentada observando os movimentos da moça, acompanhando-a com os olhos, tentando descobrir que caminho seguiria a partir de agora. Deu um gole final no chocolate, deixou a torta pela metade (assim como sua vida) e depois de anos sentada, observando a mesma cena repetidas vezes, resolveu levantar e tentar.

